Patrick Marques: “Esportes de montanha trazem amor à vida”

Por Isabella Ferreira
O grupo Cambotas Team, fundado em 2017, em Barão de Cocais (MG), reúne atletas que praticam esportes de montanha na Serra da Cambota. Inicialmente focado no slackline – que inclui caminhar, saltar ou realizar manobras sobre uma fita flexível presa entre dois pontos fixos, como árvores ou postes – o grupo ampliou as atividades, realizando treinos em praças, cachoeiras e picos da região, o que resultou no aumento do número de praticantes. Atualmente, com mais de dez membros ativos, destacam-se em modalidades como highline, trail running, mountain bike, escalada e down hill. Esses esportes consistem, respectivamente, em caminhar sobre uma fita esticada entre dois pontos elevados; correr por trilhas naturais e desafiadoras; pedalar em terrenos acidentados; escalar paredes rochosas com uso de técnica e equipamentos; descer trilhas íngremes em alta velocidade com bicicletas preparadas para o impacto.
Além disso, o grupo organiza encontros e festivais para celebrar a diversidade dos esportes radicais. Em 2022, nove eventos oficiais ocorreram na região, colocando a cidade como referência em esportes radicais e turismo. O grupo se destaca como aliado do meio ambiente, promovendo educação ambiental e preservação, levando à frente o movimento #CambotasLivreDoLixo, que há cinco anos realiza mutirões de limpeza e incentiva saúde e bem-estar. Patrick Marques, natural de Barão de Cocais, é praticante do Slackline há mais de 8 anos. Interessou-se pelo esporte com os vídeos que via na internet, juntou os amigos e começou a aprender a subir na fita de slackline na praça da cidade. Com incentivo do amigo Rogério Silva, entrou para o mundo dos esportes radicais, praticando também o highline, escalada e, a partir daí, o grupo veio tomando forma. Em entrevista ao Conecta, Patrick Marques fala sobre suas experiências com os esportes radicais e destaca a importância de se conectar com a natureza.
Conecta: Como a prática desse esporte impactou sua vida?
Patrick Marques: Nossa, mudou muito. Eu falo sem medo que eu tenho uma vida antes e uma vida depois do slackline. Eu aprendi a trabalhar de verdade o equilíbrio. Não o equilíbrio físico, sabe? Mas saber que tudo eu tenho que pensar na forma de fazer. A questão da persistência também, porque no início foi muito difícil para eu conseguir dar os primeiros passos numa fita de slackline. Então eu tinha que insistir, eu queria, eu ia atrás. E eu trago isso para a minha vida também. Se eu quero alguma coisa, eu sei que vai levar um tempo, mas se eu não desistir, se eu correr atrás, eu vou conseguir.
Conecta: Como você lida com o medo e a ansiedade durante uma atividade radical?
P.M: É um processo, não tem jeito. Porque, quando você começa, tudo é um bloqueio. Eu lembro que, nos meus primeiros highlines, quando chegava a minha vez de entrar, eu falava, pode ir, eu vou daqui a pouco. Eu estou me preparando aqui, já era essa coisa do preparo mental. Quando eu entrava, olhava para baixo, aquele abismo. Pensava: velho, o que eu estou fazendo aqui? Eu não preciso disso. Eu ficava travado. E assim, com o tempo, a gente vai focando nos procedimentos de segurança e montagem. Quando você começa a entender, ter contato direto com isso, fica muito mais fácil de você confiar no que você está fazendo e ir trabalhando o medo aos poucos. Ele não some, tá? A gente nunca perde o medo. Eu tenho até hoje, nesse tempo todo que eu pratico. Só que eu aprendi a lidar com ele. E o mais interessante é que isso você vai trazendo para a sua vida também. Você começa a trazer mais segurança para a sua vida, você começa a pensar mais no que você está fazendo, por onde você vai passar. Não tem nenhuma palavra para poder descrever o quanto isso é bom para mim. Estar em contato com a montanha, estar em contato com a natureza, isso tudo reflete muito na minha vida.
“Você começa a trazer mais segurança para a sua vida, a pensar mais no que está fazendo, por onde você vai passar“
C: Qual é a sensação de estar em contato direto com a natureza durante a prática do esporte?
P.M: A questão de estar em contato com a natureza foi o que mais me pegou nesse esporte desde o início. Foi a parte mais envolvente pra mim porque me trouxe uma conexão interna, me fez sentir e respirar melhor. É, para mim, a principal parte dos esportes de montanha, toda a beleza envolvida me traz mais amor à vida.
C: Você acredita que os esportes de montanha têm recebido a atenção que merecem no Brasil? Por quê?
P.M: Não. Eu mesmo só fui conhecer mais a fundo sobre os esportes de montanha depois de começar a praticar e muita coisa eu nem sabia que existia, acredito que é assim para a maioria dos brasileiros. Mundo afora, eu tenho alguns amigos no exterior, eu sei que é um pouco diferente, muitos esportes já são mais difundidos, principalmente a escalada, um dos esportes de montanha mais fortes hoje em dia. Mas, no Brasil, isso ainda é bastante deficiente, muito pouco praticante. Na minha cidade mesmo só eu e mais uma meia dúzia de amigos que pratica. Eu acredito que deveria ter uma visibilidade muito maior, porque a gente tem aqui muitos picos que proporcionam grande evolução para os atletas.
“O que a gente espera é que todo mundo trabalhe em prol das nossas montanhas”
C: Como a mídia e os eventos esportivos poderiam contribuir para maior valorização desse esporte?
P.M: É uma das coisas que eu busco fazer com o evento que eu participo da organização, o Cambotas High. É um dos raros festivais de highline no Brasil, hoje em dia são apenas três, se não me engano. A intenção do festival é promover a cultura dos esportes de montanha, com foco no highline que é meu esporte principal. O fato de trazer essa movimentação para uma cidade ou local, onde existe a possibilidade da prática desses esportes, atrai os olhos da população e difunde mais a existência dos esportes, as pessoas ficam curiosas. O que esses eventos e a mídia podem fazer é justamente isso, divulgar. Eles devem destacar os eventos e as conquistas dos atletas, principalmente porque os esportes de montanha envolvem muito recorde, então, é interessante a mídia trazer para o público esses feitos.
C: Você acredita que a prática esportiva pode conscientizar sobre a importância de proteger o meio ambiente?
P.M: Sim, acredito muito nisso, é uma coisa que defendo inclusive. Os esportes têm força, sempre tiveram, não só os esportes de montanha, mas qualquer tipo de esporte sempre teve uma força social muito grande de trazer para os praticantes um engajamento diferente do que eles tinham antes de começar a praticar algum esporte e, em se tratando dos esportes de montanha, eles trazem as pessoas para dentro dos meios naturais, o que valoriza muito esses meios e traz a necessidade de mantê-los bem cuidados.
C: Como as comunidades locais, próximas às montanhas, podem se beneficiar com a valorização desse tipo de esporte?
P.M: O principal meio que vejo é o turismo esportivo, que apresenta muito resultado durante a realização do Cambotas Extreme, nosso festival de highline aqui em Barão de Cocais. É um encontro que atrai muita gente de outros cantos do Brasil e até do mundo para a cidade. Essas pessoas consomem aqui, fazendo a economia local girar. Além do Cambotas Extreme, outros esportes de montanha, como as grandes corridas de motocross e de hard enduro que acontecem na região, também atrai visitantes de todo o Brasil. Isso movimenta a economia, fortalece a cultura local e acaba envolvendo todo mundo.
“O esporte traz mais qualidade de vida, as pessoas vão percebendo isso e se juntando cada vez mais”
C: Quais os planos futuros para expandir e melhorar os eventos?
P.M: O primeiro é não deixar morrer, o que é difícil, porque não temos muita ajuda. O último evento que realizamos foi na raça, correndo atrás de toda a ajuda possível. Para expandir, é preciso manter uma constância. Uma das ações que considero fundamentais é agregar mais pessoas da cidade, para formar uma comunidade cada vez maior e mais forte. Dessa forma, conseguimos ir com frequência nos lugares onde a gente está ativando os esportes, aumentando a visibilidade. Nossa região tem muito potencial para esses esportes de montanha. Pessoas de fora são apaixonadas pelo que temos aqui. Há, inclusive, potencial para ser o maior festival de highline do mundo aqui. Por isso, buscamos sempre agregar mais pessoas para ficar cada vez mais consolidado e maior.
C: Quais são as tendências ou mudanças que você espera para os esportes de montanha nos próximos anos?
P.M: Os esportes de montanha pelo que vejo vem numa crescente bem lenta mas constante. Todo ano tem novidades, equipamentos, tecnologias e métodos novos, seja qual for o esporte, seja na moto, escalada, highline, no trekking, são inúmeras variações e estão sempre aparecendo novas pessoas interessadas. Então eu acredito que a tendência desses esportes é sempre crescer.
C: O que você diria para alguém que está interessado em começar a praticar, mas ainda tem receio?
P.M: Só vai, não pense muito. Depois que você começa você se apaixona, você começa a descobrir um mundo novo, começa a se conectar de uma forma diferente com a vida, de uma forma que você nunca imaginou e tenho certeza que vai se sentir muito surpreso e apaixonado. Você vai se sentir mais vivo do que nunca se sentiu.