A potência da guerra: geopolítica mostra acirramento de conflitos

Por Arthur Mesquita, Ricardo Soares e Samuel Fernandes

A guerra entre Israel e o Hamas, iniciada em 7 de outubro, acumula milhares de mortos, e a invasão russa contra a Ucrânia, que completará dois anos em fevereiro de 2024, deixando mais de 13 mil mortos, são dois dos maiores e mais notáveis conflitos armados neste momento. Pesquisa da BBC aponta que o mundo está enfrentando um status geopolítico de pelo menos oito guerras em curso em 2023, além de dezenas de conflitos armados de menor escala em busca de territórios ou governos.

Com o fim da Guerra Fria, a sensação de que uma terceira guerra mundial, um conflito iminente que seria destrutivo a ponto de acabar com o mundo todo, cessou e o status estabelecido foi de foi um momento de grande otimismo para a paz mundial, assim como ajudaram o fim da bipolarização ideológica entre os dois blocos rivais que disputavam a hegemonia global e a emergência de países como potências, trazendo a ideia de multipolaridade e interdependência entre eles.

Queda do Muro de Berlim

Com a queda do Muro de Berlim em 1989 e a dissolução da União Soviética em 1991, muitos acreditaram que o mundo entraria em uma nova era de cooperação e diálogo entre as nações, baseada nos princípios da democracia e dos direitos humanos. A Carta de Paris, assinada em 1990 por 34 países europeus, os EUA e o Canadá, expressaram esse sentimento ao declarar que “uma nova era de democracia, paz e unidade” havia começado.

No entanto, esse otimismo logo se mostrou infundado, pois o fim da Guerra Fria não eliminou as tensões e os conflitos existentes no mundo, nem impediu o surgimento de novos desafios e ameaças à paz e à segurança internacionais. A persistência de conflitos regionais e étnicos, como na antiga Iugoslávia, na Somália, no Ruanda, no Oriente Médio,  e na Irlanda do Norte trouxeram novos problemas para esse status de paz. A proliferação de armas de destruição em massa, especialmente nucleares, por países como o Irã, a Coreia do Norte, o Paquistão e a Índia, que aumentaram os riscos de uma guerra nuclear acidental ou intencional.

A emergência de novas potências econômicas e políticas, como a China, a Índia, o Brasil e a África do Sul, que desafiaram a ordem mundial dominada pelos EUA e seus aliados ocidentais, e geraram disputas por recursos naturais, mercados e influência. A crise econômica e financeira global de 2008, que afetou a estabilidade e o crescimento de muitos países, provocou protestos sociais, desemprego, desigualdade, pobreza e migrações forçadas, o que pode ser apontado como um dos fatores mais determinantes para acirramento de diversos conflitos no mundo inteiro, a guerra ao terror. 

Em entrevista ao Conecta, o internacionalista Guilherme Issa analisa o acirramento do contexto geopolítico da guerra, em perspectiva histórica.

Guerra ao terror

Após o ataque do 11 de setembro, os Estados Unidos iniciaram a sua própria cruzada, para combater o terrorismo e os efeitos disso foram cruéis para a tentativa de criação de paz mundial. O aumento do terrorismo internacional, especialmente após os ataques de 11 de setembro de 2001 nos EUA, que desencadearam a chamada “guerra ao terror” liderada pelos americanos contra grupos extremistas islâmicos, como a Al-Qaeda e o Estado Islâmico.

A guerra ao terror americana, direcionada principalmente à países do oriente médio e organizações extremistas como Al-Qaeda e o Estado Islâmico foi responsável por violar o direito internacional e a soberania dos países invadidos, como o Afeganistão e o Iraque, que não tinham relação comprovada com os ataques de 11 de setembro de 2001. Essa guerra causou também milhares de mortes de civis inocentes, além de destruir a infraestrutura e a economia desses países.

A guerra ao terror alimentou o ódio e o ressentimento contra os Estados Unidos e seus aliados, que foram vistos como invasores e opressores pelos povos locais. Também fortaleceu o recrutamento e a atuação de grupos terroristas que se aproveitaram do caos e da instabilidade gerados pela guerra para expandir sua influência e realizar novos ataques. Desestabilizou a região do Oriente Médio e do Norte da África, que já sofria com conflitos étnicos, religiosos e políticos. A guerra ao terror contribuiu para o surgimento ou o agravamento de guerras civis, como na Síria, no Iêmen, na Líbia e no Sudão, que provocaram milhões de refugiados, deslocados e vítimas de violações de direitos humanos.

Esta guerra gerou tensões e rivalidades entre as potências mundiais, como os Estados Unidos, a Rússia, a China, a França e o Reino Unido, que disputaram interesses e influência na região. Também afetou as relações diplomáticas e comerciais entre os países envolvidos, dificultando a cooperação e o diálogo para a resolução pacífica dos problemas globais.

A guerra ao terror foi determinante para o acirramento de diversos conflitos armados e uma perturbação da tentativa de criação da paz mundial, pois criou mais violência, insegurança e instabilidade, ao invés de promover a justiça, a democracia e os direitos humanos. Diferentemente do que havia sido pensado com o fim das grandes guerras, a partir do início do século XXI, novos conflitos armados surgiram em todo o mundo, mas em outros polos, fora dos grandes centros europeus.

A globalização e a interdependência econômica entre os países tornaram-se mais intensas, mas a paz não foi alcançada. A guerra sempre esteve presente no cenário geopolítico mundial, só não mais na França, Alemanha, Polônia, Itália e Rússia. 

O mapa da guerra

O World Population Review destaca no mapa a seguir os países em guerra na atualidade. A versão interativa pode ser consultada no site.

África

O continente africano foi palco de inúmeros conflitos armados após o fim da Guerra Fria, que terminou em 1991 com a dissolução da União Soviética. Muitos desses conflitos foram heranças das disputas ideológicas e geopolíticas entre as duas superpotências, que apoiaram diferentes grupos e regimes durante a descolonização da África. Outros conflitos foram motivados por questões étnicas, religiosas, territoriais, econômicas e políticas internas dos países africanos. A paz nunca foi uma alternativa por lá, pois a violência, a instabilidade e a pobreza se perpetuaram em um ciclo vicioso. 

A guerra civil da Somália, em 1991; o Genocídio de Ruanda, em 1994; a segunda guerra do Congo, que durou de 1998 a 2003; São exemplos de guerras que aconteceram e ocorrem no continente africano após o fim da Guerra Fria. Há muitos outros conflitos que ainda persistem ou que surgiram recentemente, como a guerra civil no Sudão do Sul, a guerra civil na Líbia, a guerra contra o Boko Haram na Nigéria, a guerra civil na Etiópia, entre outros.

A paz no continente africano é um desafio que requer a participação e a cooperação de todos os atores internacionais, respeitando a soberania, a diversidade e os direitos humanos dos povos africanos, como explica Panzo Bartolomeu, graduado em Relações Internacionais, com foco em estudos de economia internacional e geopolítica africana pela Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira.

https://worldpopulationreview.com/country-rankings/countries-currently-at-war

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