Bob Marley: a primeira voz do terceiro mundo

Por Miguel Lobato

Crédito: Reprodução

No dia 6 de fevereiro de 1945, em uma pequena vila chamada Nine Mile, na Jamaica, nascia Robert Nesta Marley: o mitológico músico, cantor e compositor que mudaria o mundo para sempre dentro de um curto período de tempo.

Bob Marley, como viria a ser seu nome artístico, é o principal responsável pela popularização do reggae, mas também foi uma das figuras mais importantes e influentes do século XX, devido a uma série de coisas que muitas pessoas hoje em dia desconhecem.

O nome de Marley, não por acaso, se tornou reverenciado em todos os cantos do mundo. Depois de alcançar sucesso internacional com os discos “Catch A Fire” e “Burnin”, ambos de 1973, a vida do artista foi palco de acontecimentos realmente grandiosos (além do inquestionável e avassalador sucesso) que merecem ser notados.

Feitos Importantes

Bob Marley foi um cara que nunca temeu expressar suas convicções nas letras das músicas. Várias delas falavam sobre a situação comunitária delicada na Jamaica, refletindo coisas como revolução contra o racismo estruturado, discriminação, espiritualidade, liberdade e justiça. No início dos anos 70, eram poucos os músicos que abordavam tais assuntos. Os tempos eram de Guerra Fria, e qualquer menção a essas coisas poderia ser facilmente considerado discurso de esquerda politicamente engajado por radicais; principalmente nos Estados Unidos, o maior centro comercial da indústria fonográfica. No entanto, como ignorar uma realidade social com tantos fatores problemáticos, quando ela fez parte da vida de Marley e ainda fazia parte da vida de seu povo? Essas letras inspiraram pensamentos sociais revolucionários, principalmente na Jamaica. Muitos artistas e gêneros musicais passaram a tocar em tais discussões nos tempos seguintes.

O rei do reggae ainda era conhecido como um dos maiores agentes da paz dentro do universo da música.

Em 1976, nas eleições parlamentares jamaicanas, o país vivia um dos momentos mais terríveis e violentos de sua história. O cenário era de verdadeira guerra civil, devido à rivalidade de partidos. Neste ano, Marley quis dar um show gratuito pela união e paz. A ideia foi apoiada pelo primeiro-ministro Michael Manley, líder do partido PNP. Mas, dois dias antes do show, um grupo de indivíduos armados invadiu a casa de Bob Marley onde ele ensaiava, e dispararam para todos os lados. Milagrosamente, ninguém foi morto no ataque. Marley levou um tiro de raspão no peito e a bala se alojou no braço. Rita Marley, sua esposa, chegou a ter um projétil preso no couro cabeludo. O empresário do músico, Don Taylor, foi atingido várias vezes e passou a viver numa cadeira de rodas desde então.

O que ninguém esperava era que Bob Marley, em pessoa, mesmo tendo sido baleado dois dias antes, saísse do hospital no dia do show, com o braço enfaixado, e subisse no palco para mostrar seus ferimentos. Ele declarou na ocasião: “As pessoas que estão a tentar destruir o mundo não tiram dia de folga. Como eu poderia tirar, se estou tentando fazer o bem?”

Em 1978, Marley voltou para a Jamaica e cedeu outro show gratuito. Ele chamou ao palco os dois líderes dos partidos políticos rivais para que apertassem as mãos fazendo um juramento de paz. 

Nesse mesmo ano, o cantor foi condecorado pela ONU com a Medalha da Paz do Terceiro Mundo.

Bob Marley faz os dois adversários políticos jamaicanos apertarem as mãos no palco. / Crédito: Ebet Roberts/Getty

Legado

Com mais de 75 milhões de álbuns físicos vendidos e dezenas de milhões de visualizações em plataformas de streaming nos dias de hoje (mais de 40 anos depois de sua morte), Bob Marley é exponencialmente o maior nome do reggae e o artista vindo do terceiro mundo mais famoso da história da música. O sucesso que sua obra tem com as gerações mais novas só comprova sua imortalidade musical.

Mas não só de música vive Bob Marley. Na realidade, ele é um daqueles tipos de personalidade que transcende sua área de atuação para influenciar profundamente inúmeros aspectos nas vidas das pessoas. Seria perfeitamente justo colocá-lo na mesma prateleira onde se encontram sujeitos como John Lennon, Pelé e Elvis Presley.

Ao se analisar bem, são visíveis as raízes de influências de Marley no jeito que as pessoas vivem hoje em dia; como elas pensam, se vestem, cuidam da aparência, o que consideram importante…

O rei do reggae pode não estar entre os vivos há mais de 40 anos, mas a locomotiva de seu legado é imortal e continua em alta velocidade. Basta ter atenção e olhar o mundo em volta: Bob Marley está presente, de certa forma. Talvez esteja em pequenos detalhes que passam facilmente despercebidos. Ele é uma lenda viva, um fantasma que (por sorte) ainda assombra positivamente o mundo.Bob Marley foi o primeiro artista musical vindo do terceiro mundo que se tornou conhecido e aclamado no planeta inteiro, abrindo portas para outros que vieram depois; ajudou a desmontar um pouco do muro de ignorância que os europeus e norte-americanos levantam contra o restante dos povos; foi um quebrador de tabus, defensor da liberdade e da igualdade, assíduo combatente do racismo, do preconceito e do radicalismo político; foi um verdadeiro influenciador, que usou sua arte para levar a história de seu povo para os ouvidos daqueles que a esqueceu. Ele é a voz dos marginalizados, dos desvalidos, dos que são discriminados: a Voz do Terceiro Mundo.  

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