Comercialização irregular de camisas de futebol cresce no Brasil
Cerca de 40 milhões de brasileiros comprando algum item pirateado em 2021
Por Douglas Hezron, Hugo Ferreira, Luccas Melo e Matheus Henrique
Considerado hobby por muitas pessoas, comprar camisas de times de futebol já se tornou um costume dos apaixonados pelo esporte, sobretudo no Brasil, onde essa paixão se inflama ainda mais. Há quem faça coleção de camisas diferentes em casa.
Porém, como acontece com quase tudo que é comercializado no país e no mundo, a pirataria começou a tomar conta também desses produtos. Devido ao encarecimento dos produtos oficiais que chegam a custar quase R $500 em algumas lojas, o mercado irregular de camisas tem se tornado cada vez mais a opção favorita dos amantes do futebol que apenas querem ter um produto que represente o seu clube, ou até mesmo a seleção.
Um estudo realizado pela Ipec (Inteligência em Pesquisa e Consultoria) e encomendado pela Ápice (Associação pela Indústria e Comércio Esportivo), entidade formada por grandes empresas do setor de produtos esportivos do mundo — entre elas Nike, Adidas e Puma — mostra que quase 40% das camisas de times de futebol comercializadas são falsificadas.
Segundo a Ápice, 50% dos entrevistados da pesquisa compraram ao menos uma unidade não-original de produtos esportivos e 17% adquiriram exclusivamente unidades falsificadas. Isso equivale a cerca de 40 milhões de brasileiros comprando algum item pirateado em 2021.
São números impressionantes que demonstram um prejuízo para as marcas e clubes que comercializam produtos mas veem os torcedores utilizando peças paralelas. Segundo o levantamento do IPEC, as perdas em vendas chegaram a R$ 9 bilhão para as empresas esportivas.
Por que essas estatísticas são tão altas?
O Conecta entrevistou vendedores de lojas oficiais e de produtos pirateados, além de torcedores que têm costume em adquirir novas camisas para sua coleção e uso pessoal.
Com o crescimento do preço desses produtos nos últimos anos, até mesmo o público consumidor de camisas oficiais começou a migrar para o mercado paralelo. É o que conta Asaf Wingester, vendedor em uma loja de camisas pirateadas em Belo Horizonte: “A gente tem recebido um tipo de clientes que não fazia parte do público comprador de camisas falsificadas. São pessoas mais elitizadas e de classes sociais mais altas, mas que, devido ao que é cobrado em uma peça oficial, se torna inviável até para quem tem uma condição financeira melhor”.
O estudo ainda apresenta quem é o maior responsável pelo crescimento do comércio irregular: os sites de venda na internet. A Shopee Brasil, e-commerce que opera no País desde 2019, é o principal exemplo. São cerca de 17 mil vendedores que comercializam produtos esportivos falsificados no Brasil e no exterior, com mais de 100 mil links e seis milhões de peças. Os mais famosos são os tailandeses que produzem as peças e exportam para brasileiros que querem pagar mais barato em itens esportivos.
Em 2022, alguns clubes como o Corinthians e marcas como a Nike conseguiram remover sites e páginas na internet que comercializavam seus produtos de forma ilegal. A vendedora de uma loja de produtos esportivos licenciados Gabi Muniz tem uma opinião forte. Para ela, o ideal seria aproximar os torcedores e não forçá-los a pagar mais caro: “Não adianta derrubar os sites de venda das camisas falsificadas porque atualmente está tudo muito caro [em relação às camisas oficiais] e a maioria das pessoas sempre preferem o preço e não a qualidade dos produtos”.
É necessário também levar em conta a opinião e princípios de quem realmente movimenta este mercado: os torcedores. Com a possibilidade de importar camisas quase idênticas às originais, muitos pararam de investir alto para ter algo que representasse sua paixão pelo clube.
Torcedora e acostumada a comprar produtos na ‘Shopee’, Ana Júlia Livighi explica que as versões importadas para o Brasil possuem melhor qualidade, por isso não se importa em comprar: “Eu encontrei algumas lojas que vendem algumas falsificadas com um tecido muito bom, assim não influencia tanto na hora de pensar se compro ou não, mas as que possuem um tecido mais abaixo do comum me incomodam um pouco”.
Mas, algo poderia ser feito, não?
A pirataria é crime previsto no Código Penal com pena de até quatro anos e pagamento de multa. Além disso, os produtos falsificados não levam nenhum benefício ao clube, bônus que servia de incentivo para a comercialização de camisas oficiais.
Amanda de Oliveira é torcedora do Palmeiras e pensa que o mercado pirata perderia força se uma atitude fosse tomada pelas marcas e clubes: “As marcas poderiam fazer modelos com preços mais acessíveis. Se eu fosse comprar todo ano somente as três camisas que o Palmeiras lança, teria que gastar em torno de R$ 900. Já tentei esperar uma promoção, mas acabou não valendo a pena”.
Há também os torcedores que se recusam a comprar camisas falsificadas e que, mesmo com os altos preços, conseguem pagar pelos produtos oficiais que desejam. Nathalya Oliveira é um exemplo disso. Aos 24 anos, ela preza pela originalidade dos produtos quando vai comprar um novo lançamento: “Eu gosto das camisas oficiais para ter uma marca de cada época do meu time. Gosto de autografar algumas, então prefiro que sejam originais”, expõe a torcedora.
Matheus Barbosa também não curte comprar camisas sem beneficiar diretamente o clube, mas não concorda com os preços e taxas que são cobradas nesses produtos: “O problema dos produtos licenciados não é serem caros, mas valer aquilo que é atualmente cobrado. Uma camisa de futebol simples de torcedor não deveria custar nem 50% do valor produzido e mesmo que fosse as marcas poderiam se esforçar de alguma forma para driblar essa ‘crise’. Se nada mudar, vão continuar perdendo espaço para os produtos paralelos”.
Por que as camisas esportivas são tão caras?
Atualmente, sobre a produção das peças incide ICMS e IPI na saída do estabelecimento que fabricou. Sobre a receita de venda, o fabricante recolhe IRPJ, CSLL, PIS e Cofins. Esses impostos encarecem o preço final do artigo esportivo que é repassado ao consumidor. Já quem produz o artigo pirata não paga imposto, muito menos investe em tecnologia e marketing.
A pirataria é um crime que precisa ser combatido. Mas o desejo de representar o seu clube do coração com uma camisa custar tão caro ao bolso do brasileiro que, geralmente tem baixo poder aquisitivo, deve ser priorizado, para acesso do torcedor ao produto.
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